segunda-feira, 7 de março de 2011

Contornando os mares entre as nuvens de um rosto imperceptível...

Pela janela do avião as nuvens que antes jaziam inertes ao nossos olhos terrestres tomam contornos definidos pelas janelas dos sonhos que a pupila do passageiro traz consigo. Ao voar entre cada pedaço de pluma esbranquiçado (ás vezes tão levemente pesado) percebemos o quanto acentua-se em nós o reconhecimento de nossa pequenez. Vejo rios, montanhas e casas formiguinhamente expostas ao longe encobertos pelo ar que encontra os ventos róseos das distrações. Estar entre as nuvens é uma situação inexplicável. Sentir o fino algodão próximo destraídamente ir expandindo os braços em direção á pupila em estado de encantamento é a mais pura tradução de leveza. Enormes blocos de paisagens avistam-se no horizonte. Há um mar espahando sua espuma entre devaneios e tons reveladores de um vazio tão profundo...De vez em quando elas separam-se (essas coisinhas flutuantes que costumam chamar de nuvens e que eu chamo de moradas dos sonhos, junto com o mar e o crepúsculo). Elas formam figuras tão volúveis quanto a imaginação puder destacar. Nos rios e contornos de cada olhar se confudem as visões nubladas repletas de cerração  das visões dos que contemplam. Nos resta apenas meditar. Levitar ao sabor do vento é uma experiência única. Um dia, conheci um guri que embarcou numa aeronave metamorfoseada em nuvem.  Neste instante da transformação completa, ele aos poucos esquece as máscaras de oxigênio, as poltornas flutuantes e se deixa levar na imensidão do mar azul.Até aterissar sem saber onde está. Ao desembarcar daquela nuvem percebe uma rocha  próxima que lhe parece familiar. E, antes de acordar consegue ver um rosto com as linhas de expressão misturadas a uma névoa espessa. Vai até os olhos, move as pálpebras, desenha com as mãos o contorno dos lábios e deita-se ao lado das bochechas, formando com a pele um travesseiro. Adormece até algo que parece ser uma manhã. Vai então aos poucos acordando e então resolve, sem a interferência das brumas de outrora reconhecer o rosto. Consegue perceber que o tempo todo deitou sobre a superfície de um espelho. No chão inerte, sem os contornos da noite nublada, jaz um espelho. Apenas o reflexo de seu rosto expandido sobre a superfície daquela montanha...



Um comentário:

  1. Sendo o outro meu espelho, como distinguir os contornos? Creio que quanto mais mergulhamos no nosso universo interior, desnudando véus e encarando o sombrio, menos espelhada revela-se a relação com o exterior e com os outros... Ah, mas não será o amor a busca, como diria Ovídio, do reflexo de nosso eu nos olhos do amado?

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