segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

sobre árvores e meninos saciados...

Ele aproximou-se de um restaurante e encontrou um menino em frente à porta. O pequeno tinha suas mãos estendidas e o olhar sofrido. Teve pena dele. Parecia realmente precisar de ajuda. Convidou-o para entrar consigo. O menino olhou desconfiado. Nunca o haviam levado para almoçar. E bem naquela hora do dia. Mas os pratos lá dentro pareciam deliciosos. Seguiu aquele senhor que se apresentou apenas como um poeta. Não era dali. O resto não diria. Iria sumir assim como tinha aparecido. Por via das dúvidas, entrou, que preocupações são coisas de quem já saciou a fome, que é a preocupação mais genuína. Entrou no restaurante. Deslumbrou-se com os pratos que o poeta pediu. Em cada borda, em cada refeição havia algo que ele nunca tinha visto antes e que não sabia explicar. Correu os olhos pelo lugar. Nunca tinha estado ali, do contrário, certamente lembraria. Os pratos foram vindo e o poeta apenas observava. De vez em quando ,ele abria os lábios para dizer coisas que o menino nunca havia escutado mas que o arreabatavam para um mundo desconhecido. Terminaram de comer. Iam sair e o menino pediu-lhe que ficasse junto, porque precisava voltar outro dia. O poeta apenas sorriu. E de repente, em frente a primeira fonte do chafariz mais próximo, ele sumiu. O menino olhou para os lados, não mais o encontrou. Restou apenas sobre os seus pés um prato, parecido com os outros, que o menino sabia ter sido deixado ali de propósito. Chamava-se "O semeador de estrelas". Sabia que iria devorá-lo até o fim. Mas teve uma ideia melhor. Saiu pelas ruas á procura de outro menino que estivesse de mãos estendidas. Se apresentaria como discípulo do poeta e lhe mostraria o mesmo restaurante. Um dos pratos, ele já trazia em maõs. Com certeza encontraria muitos meninos tão famintos quanto ele. E haveria de apresentar o alimento que lhe fora oferecido. E lhe mostraria outros mundos, esfacelando suas tristezas e colocando-as na palma das mãos. Tornou-se um semeador de estrelas. Encontrou muitos meninos sedentos. Até perceber que teria que partir e à sombra da primeira árvore florida despediu-se. Todos os anos muitas crianças vem assentar-se à sua sombra. De vez em quando de suas raízes brotam algumas páginas com alguns textos, coisas simples, Clarice, Drummond, Quintana, Cecilia, Vinícius, Adélia e Manoel, todos aparecem nos pedaços de seus galhos. E uma melodia ora triste, ora alegre de vez em quando surge com a brisa. Não se sabe de onde vem, mas para onde vai as crianças não tem mais dúvida. Para o mundo das coisas que não existem, para voltarem repletas de um colorido todo especial. O restaurante? Fica bem em frente, para lembrar o dia em que o menino encontrou o poeta. De vez em quando um tal de Alberto Caeiro aparece por ali. Não pede prato algum, apenas contempla a árvore  da janela e sorri. Não se sabe o que estará pensando. E se olharmos com bastante atenção, toda vez que ele surge, uns pássaros que ninguém conhece de umas penas exuberantes e cheias de cores vêm fazer ninho nos galhos que brotam em cada intervalo de seu sorriso...


Um comentário:

  1. Distante... Ou mesmo próximo, minha inclinação para estas palavras seriam insuficientes. Estaria eu revestido de/com outras concepções?

    - Talvez eu já tenha um fardo, não é caro Cronista? - Quem ainda hoje me diz o seguinte: "A verdadeira crítica é como o Farol de Alexandria".

    Faço questão de gritar, se preciso for. Este é um não tão simples texto. E somos separados por ele. Esta é a escrita do Éderson que eu conheci em Março - talvez ano passado - na Universidade.
    Exatamente a sua face. Texto repentinamente poético, versos cheios de... "Coisas que o Éderson sabe."

    - "E lá se vai o caleidoscópio em mãos. Apagam-se as luzes do Farol".

    - Juan Oliveira =]

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