quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

sobre diários e cacos que formam a alma de quem escreve



O diário é um livro de folhas em branco sem significado algum. O dono é que vai impregnar nele os sentidos cotidianos que merecem ficar na lembrança. Todo diário é uma junção de cacos, de contornos e impressões que pertence aquele que o escreve. Isso mesmo. Os pedaços que formam o emaranhado de cada instante, de cada lugar ali impresso, gravado com o sangue de quem redigiu. Mas redigir é tarefa penosa. Lembra que devemos nos despir em frente a um templo sagrado do qual somente nós teremos a chave. Significa reconhecer-se nos espelhos daquilo que se escreveu. Nos insterstícios das palavras, profundamente exaurimos nossos defeitos, revelamos quem somos e transubstanciamos por completo a matéria de que somos formados. Por isso que encontrar um diário fechado e abri-lo significa uma invasão sem precedentes. Um estupro de nossas ideias mais íntimas e uma violência sem desculpa. É impossível conhecer uma pessoa diretamente. Mas ao encontrar o que ela guarda, podemos traçar um perfil, que será único, pois cada pessoa guarda coisas que para si são essenciais. Um diário normalmente é secreto porque é preciso esconder a alma na sua nudez. Quem lê um diário descobre a alma do dono. É um espelho que guarda minhas imagens passadas. Os sentimentos, as sensações, os desejos e os anseios que em mim palpitam. Nossos diários são as imagens que desejamos guardar e que queremos que sobrevivam ali, quietinhas, eternizadas no papel, aonde podemos retornar sempre que tivermos vontade. Ali estão as vozes e melodias que me inspiraram e me fizeram sorrir ou chorar. Meus suspiros, minhas dores e o pulsar de um coração num mundo sem coração, minhas esperanças e canções. E só competem a quem escreve, nada mais. Fechando-se as folhas, para o mundo lá fora, elas retomam sua brancura original.  

3 comentários:

  1. Justamente no último dia, dia em que seus registros perderam "sua" principal Orbe, aquele quem sempre escreveu "a sua última página", se depara com a dor de seus cacos; a impressão de que tudo perdera o sentido; de que ele havia encontrado a tênue linha entre o fim, e a ausência.
    Se não bastasse um mundo lhe esperar, a fim de abocanhá-lo com aquela sensação gélida, chamada Solitude, o personagem de suas próprias linhas encara, no espelho do outro, o eco da sua própria essência.

    Quais são as possibilidades de tudo encaixar-se assim...?

    Para mim, esta data não é uma coincidência que deve ser desprezada.
    - Obrigado Éderson, agora minhas páginas podem dizer aquilo que eu não soube lhes fazer contar.


    Meu Diário se fecha novamente [...]

    - Apenas 129600 minutos monocromáticos...

    - O pior(?) é que existirei para suportar.

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  2. Escrevo diários. Confesso que adoro fazer isso. Meu diário é onde eu posso ser eu mesmo, sem ter que me explicar ou usar máscaras.
    Não sou daqueles que o fecha a sete chaves, todos sabem que está na minha gaveta. Mas me sentiria violado se alguem o lesse. Será que iriam me entender melhor?

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  3. Já sou seu seguidor.www.pensarpoesia.blogspot.com

    Vai lá!

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